Exemplo de Profissionais Vocacionados : Inspire-se!!!!

Deixo para seu deleite dois exemplos públicos de pessoas que são profissionais por vocação, no sentido mais sublime do termo. E a partir destes dois relatos com certeza você conseguirá identificar pessoas próximas em sua realidade tão iluminadas como estas. E mesmo refletir na sua própria postura profissional, suas motivações interiores para exercer sua profissão ou sair em busca de novos desafios. 

Estes exemplos nos permitem descobrir que a dimensão do serviço é implícita em qualquer tipo de profissão.

A seguir apresento reportagens do jornal "O Estado de São Paulo", com entrevistas com dois profissionais da área de direito. Eu tenho uma admiração especial pelo Dr Ricardo Fonseca, o qual tive o prazer de assistir uma palestra no Congresso Internacional de Saúde Mental e Trabalho, em Gionânia em 2006. Uma pessoa muito encantadora!Gosto desta frase dele:

 

 "Não tenho mais grandes ambições. 
Quero ser um juiz sensato, sábio e justo"

                                                                                                             Dr. Ricardo Fonseca


A seguir as entrevistas. Apreciem!

                                                      Daniela

..................................................................................................................

http://www.estadao.com.br/nacional/not_nac403863,0.htm


quinta-feira, 16 de julho de 2009, 19:18 | Online

Procurador cego é aprovado para cargo de desembargador

Duas décadas após ser reprovado por deficiência, procurador realiza sonho de se tornar juiz
 
Felipe Recondo - O Estado de S. Paulo
 
BRASÍLIA - Há 20 anos, Ricardo Tadeu Marques da Fonseca foi reprovado no concurso para juiz do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo por ser cego. Nesta quinta-feira, o sonho de ser desembargador foi concretizado - foi nomeado desembargador do TRT do Paraná e passou a ser o primeiro magistrado cego do país. "Estou tentando ir para a magistratura para realizar um sonho que tive no início da carreira e me foi negado. Não tenho mais grandes ambições. Quero ser um juiz sensato, sábio e justo", disse ele ao Estado, antes de saber da nomeação. Nem a Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) nem o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sabem da existência de algum juiz cego no Brasil. 

Ricardo Tadeu, 50 anos, nasceu prematuro de seis meses e teve paralisia cerebral. Sua visão ficou logo comprometida. Os movimentos dos braços e das pernas também foram prejudicados - hoje anda com alguma dificuldade, mas recuperou totalmente o movimento dos braços.

Até os 23 anos, enxergava com muita dificuldade. Aos 23, no terceiro ano do curso de Direito da Universidade de São Paulo, perdeu completamente a visão. Formou-se com a ajuda dos colegas e está, há 17 anos, na Procuradoria do Trabalho do Paraná.

Como o senhor ficou cego?

Eu nasci há 50 anos depois de uma gestação prematura de seis meses. Tive paralisia cerebral. Então eu tenho uma deficiência nas pernas e tive baixíssima visão até os 23 anos. Aos 23 anos, perdi totalmente a visão.   


Como foi sua escolarização?

Eu fui alfabetizado pela minha mãe. Ela me ensinou a escrever e a fazer contas em papel de pão, porque eles eram grandes e era preciso escrever com letras grandes para eu ler. Na escola eu tive professoras fenomenais que escreviam os textos com letras maiores para eu poder ler.

Não foi para uma escola especial?

A minha família achava que eu tinha que estudar numa escola comum. Inclusive eu jogava bola com a molecada. Eu era grosso, mas jogava. Sempre fiz tudo, brigava, apanhava, batia... 


Como foi o vestibular?

A Fuvest na época não sabia como fazer a prova pra mim. Eu propus que eles gravassem as questões em fita cassete, eu ouviria e escreveria as respostas. Fui assim que fiz as provas e passei no Largo São Francisco.

O sr. ficou cego no meio do curso. Como fez para se formar?

Foi no terceiro ano. A minha turma, de 1984, foi muito legal. Cada colega escolheu um livro que gostava mais e gravou o conteúdo em fita cassete. Eles leram para mim. Eu escutava tudo e fazia as provas oralmente. Assim eu me formei, fiz mestrado na USP e doutorado na Universidade Federal do Paraná.

E sua carreira profissional?

Eu comecei a trabalhar num escritório de advocacia trabalhista, remunerando os meus ledores. Mas ninguém me dava emprego. Era muito difícil eu conseguir um emprego melhor. Aí, o juiz Osvaldo
Freus, do Tribunal do Trabalho de Campinas, me convidou para ser assessor dele. Eu trabalhei com ele por cinco anos. E ele me estimulou a fazer concurso para a magistratura.

O sr. fez as provas?

Comecei a fazer o concurso em 1989. Eu estava entre os 10 primeiros colocados e quando eu ia fazer a prova de sentença, que era justamente com o que eu trabalhava, anteciparam o meu exame médico. E eu fui cortado.

Com que argumento?

Juiz cego não pode trabalhar. Eu sempre contestei isso. Eu sempre dizia: senhores juízes, quando os senhores têm de ler um texto em língua estrangeira se louvam de um tradutor juramentado. Não é assim? É. O ledor funciona para mim como o tradutor juramentado funciona para vocês.

Na época o presidente em exercício era o juiz Nicolau dos Santos Neto.

Era.

E ficou por isso mesmo?

Naquela época o centro acadêmico da Faculdade de Direito realizou um ato público. E quem estava na direção do centro acadêmico era o Toffoli (José Antonio Dias Toffoli, advogado-geral da União). Eles ficaram indignados com a história e fizeram um ato público. Foi o que me fez acreditar na Justiça.

O sr. não tentou nada pela via judicial?

O ministro Eros Grau era meu professor na época e fez um mandado de segurança pra me defender. Ele e a Paula Dallari. Não deu certo, mas foi lindo o mandado de segurança.

Depois o sr. foi para a procuradoria.

Fiz concurso para procuradoria. O procurador-geral era o Aristides Junqueira e a posição dele era: "Se o Ricardo passar, ele vai fazer estágio probatório. Se passar no estágio probatório vai ser efetivado".

Nesse caso, a cegueira não atrapalhou?

Eu não acho que a cegueira deva ser usada como um pretexto médico, porque não é uma questão médica, é uma questão técnica. Se um cego pode ou não ser procurador é uma questão técnica, de Direito, e não médica.

E não teve dificuldade na procuradoria?

No começo eles não sabiam como lidar comigo. Hoje eles me disponibilizam tudo o que preciso. Continuo trabalhando com ledores, eles leem todos os processos e eu dito o que deve ser escrito. Eu participo de audiências de instrução de inquérito em que ouço testemunhas. E eu devo ter ingressado com dezenas de ações civis públicas, inclusive com provas que eu colhi. Todas foram julgadas procedentes.

E nas audiências, como era?

Eu instruí centenas de inquéritos civis. E nessa instrução eu presidia audiências em que tomava depoimentos de testemunhas. Eu sempre percebia que a testemunha estava vacilante por causa do tom da voz. Isso nunca foi problema para mim. Aí eu apertava e conseguia a verdade. Eu sempre instruí muito bem meus inquéritos. Eu ouço a respiração, o tom de voz. Eu percebo quando a testemunha se mexe na cadeira, se está à vontade, se está nervoso, tudo isso eu detecto pela voz.

O sr. espera alguma resistência se for nomeado desembargador?

Não. Eu tenho fé que não, que isso será assimilado pela sociedade brasileira.
 
Do que o senhor necessitaria no TRT?

Os desembargadores têm assessores. Eu preciso do mesmo número de assessores. E com o tempo quero me adaptar ao programa de leitura de voz de computador que lê tudo o que está na tela, porque os processos serão digitalizados. Aí nem de ledor humano precisarei mais. É uma questão de tempo.

É a favor de cotas para deficientes nos concursos para juízes?

Sou a favor. Essa determinação está no artigo 37, inciso VIII da Constituição, que determina que nos cargos públicos seja reservada uma cota, na forma da lei, para pessoas com deficiência. Defendo essa norma porque reforça o princípio da igualdade. As pessoas com deficiência, até hoje, têm seus direitos humanos negados. Hoje a deficiência é um conceito social, não é mais um conceito médico. Uma pessoa é deficiente na medida em que a sociedade lhe dá ou não os meios para exercer os seus direitos.

Mas o sr. não quer entrar por cota?

Eu não gostaria de entrar por causa disso, quero que seja analisado o meu currículo. Mas é o presidente que vai analisar isso, é ele que vai decidir. Não quero ficar supervalorizando meu currículo. Eu respeito os meus colegas. Todos eles são muito bons.

Não acha que podem dizer que a escolha do seu nome é algo politicamente correto?

É só as pessoas olharem o processo (de escolha dos desembargadores) e analisarem os currículos. Não peço nada mais do que isso. Estou participando dessa campanha em igualdade de condições com os meus colegas e confio no meu currículo. Acho que tenho qualificação para o cargo, como todos os meus colegas da lista têm.

No TRT o senhor encontrará alguma dificuldade?

Os juízes colocaram a minha colega (Thereza Cristina Gosdal)em primeiro lugar da lista por conta de uma tradição da Corte de prestigiar quem esteve em listas anteriores. Mas todos elogiaram o meu currículo. Houve um depoimento de um juiz que disse: "Eu entrevistei o Ricardo e tinha dúvida se era possível ele ser um juiz, porque não queria contratá-lo por conta da falta de visão nem impedi-lo por isso. Então precisava ser convencido. E ele me convenceu."

Qual é o topo da carreira para o sr?

Eu já sou um homem realizado. Como procurador, fiz tudo o que eu queria. Ajudei os deficientes, ajudei a combater o trabalho infantil. Fiz muita coisa. Estou tentando ir para a magistratura para realizar um sonho que tive no início da carreira e me foi negado. Não tenho mais grandes ambições. Quero ser um juiz sensato, sábio e justo.

======================================================================

 
Daniela Cembranelli, a nova defensora-geral

Aos 42 anos, ela assume na sexta-feira um dos cargos mais importantes do Estado com o compromisso de brigar pelos pobres e pela transformação social

O Estado de S.Paulo

A advogada Daniela Sollberger Cembranelli é uma dessas mulheres que parecem estar sempre voltando de férias. Pele viçosa, cabelos obedientes, rosto harmonioso, nitidamente vaidosa, ela, bem, ela não quer falar disso. A nova defensora-geral de São Paulo prefere conversar sério.

Assunto não falta. O discurso em favor dos desfavorecidos é apaixonado, contundente e, por via das dúvidas, didático. Ela explica com entusiasmo o trabalho à frente da Defensoria Pública, instituída pela Constituinte de 1988, mas estabelecida no Estado apenas em 2006.

"O defensor público não é só um "advogado de pobre". Seu compromisso é com a transformação social.,diz. Está no artigo III da Lei Orgânica 988/2006: a ele se atribui a função de mudar o estado das coisas ", diz. Eleita com larga vantagem para o cargo que assumirá no dia 14, Daniela teve 296 votos, contra 86 do segundo lugar e 71 do terceiro. Contou pontos o empenho com que coordenou em Brasília o núcleo de segunda instância e tribunais superiores, nos quais lutava até os últimos argumentos pelos direitos dos muito carentes.

"Ela é aguerrida, batalhadora e está envolvida com o projeto da Defensoria desde o início. É a mais preparada para tirá-lo do papel", afirma sua antecessora, Cristina Guelfi, cujo apoio à candidatura foi crucial.

Por todos esses atributos, a nova defensora-geral reage mal quando associam sua vitória ao fato de ser mulher do promotor-herói do ano, Francisco Cembranelli, que atuou no caso Isabella Nardoni. "Ele é promotor, eu concorria à Defensoria Geral. São funções opostas, nada a ver."

Em casa, Promotoria e Defensoria vivem uma trégua que já dura 14 anos. "Tivemos alguns embates acirrados no tribunal e logo me apaixonei", diz Cembranelli, de 49 anos.
Daniela, de 42, tem dois filhos com ele. Guilherme, de 10, e Rafael, de 9, são as prioridades em seu movimentado dia a dia. Quando resolveu fazer campanha para concorrer à Defensoria, ela teve uma conversa com o marido para saber se ele a ajudaria com os meninos. "Me prontifiquei a "substituí-la", se é que é possível substituir uma mãe", diz ele. "O Francisco é um grande companheiro, dedicadíssimo aos filhos", afirma ela.

Confusão. Alçado instantaneamente à categoria de galã, o promotor ganhou milhares de fãs de uma hora para outra. Daniela garante que não tem ciúme. "As pessoas precisam de modelos, referências, e confundem os papéis", diz ela, sem a menor sombra de contrariedade (nem de paciência).

O Sollberger em seu nome é do pai, que nasceu na Suíça, migrou com a família para o Brasil e morreu sub-procurador geral da República. O colorido moreno é da mãe, que nasceu em Goiânia e se dedicou ao lar. Daniela foi criada com os dois irmãos em Brasília e, apesar de estar tão perto do poder e de ter escolhido lutar pelos direitos dos mais carentes, nunca participou de política estudantil nem se filiou a partido.

"A faculdade (Universidade de Brasília) foi, para mim, o lugar onde eu comecei a me interessar de verdade pelo que eu estudava. Até ali eu gostava de brincar, especialmente com os meninos", diz ela, que ainda considera a amizade dos homens mais leal.

Pronto. Agora que declarou o basicão do currículo pessoal, ela quer voltar a falar de seu compromisso com os carentes, da urgência de se aumentar o número de defensores públicos no Estado, da quantidade recorde de habeas corpus impetrados em São Paulo, enfim, parece que o tempo da entrevista não vai ser suficiente para tudo o que ela precisa dizer sobre "a razão de ser do defensor público". "A gente poderia ficar aqui o dia todo falando sobre isso", resume.

Sua intenção de mudar o "estado das coisas" parece ainda mais pertinente dentro daquela sala de paredes guarnecidas com madeira escura, iluminada por vitrais coloridos, instalada em um prédio de cerca de 70 anos chamado Adhemar de Barros Filho. "Mas essa não sou eu", diz ela para o fotógrafo, enquanto ele tenta enquadrá-la junto aos vitrais, com a mão na cintura. "Parece pose de modelo."

Admirada por uma legião de jovens defensores, Daniela ficou famosa "por sua postura no plenário". "Quando tinha júri com ela, todo mundo ia. A Dani sempre foi uma referência de qualidade técnica e de entrega irrestrita àquilo em que acreditava", diz o segundo sub-defensor geral, David Depiné, de 37 anos, que dividiu com ela por quatro anos uma sala no Fórum de Pinheiros.

Até 2006, quem fazia o trabalho dos defensores públicos eram os procuradores de assistência judiciária. Daniela explica com orgulho que, dos 330 procuradores que atuavam na área, apenas 87 optaram por trabalhar na Defensoria Pública. Ela e os outros 86 deixaram de ganhar 50% no salário, basicamente para seguir um ideal.


A defensora-geral não revela quanto ganha. Conta que o salário inicial de um procurador é de R$ 13.500; o de um defensor, cerca de R$ 9 mil. No caso dela, é preciso acrescentar as gratificações de 17 anos nas funções e os "dois ou três mil" que ganha a mais no novo cargo. Também não é assunto que a entrevistada queira prolongar...

No fim da entrevista, ela se levanta da cadeira e, mesmo calçando um sapato com cerca de 8 centímetros de salto, não perde o tipo mignon. Em um raro recuo na decisão de não resvalar em assuntos frívolos, Daniela, 1,60 metro, diz que, sim, gostaria de ser um tantinho mais alta. Mas isso soa mesmo irrelevante diante da estatura profissional da moça.






Nenhum comentário:

Postar um comentário

Video: Os desafios extras na conciliação da carreira e a criação de filhos(as) com deficiências

Assisti semana passada. Muito interessante!  Existe um antes e um depois do nascimento de um filho e é uma pena não considerar a riqueza des...